Senhoras e senhores, bem-vindos à República
das Bananas. Após uma sequência avassaladora de decisões e reações que geraram profunda
insegurança jurídica, não há termo mais adequado para identificar nossa atual conjuntura.
O Judiciário é o guardião da Constituição e
deve fazê-la valer, em nome dos direitos fundamentais e dos valores e
procedimentos democráticos, inclusive em face dos outros Poderes. Eventual
atuação contra majoritária, nessas hipóteses, se dará a favor, e não contra a
democracia.
Entre as salas e os inúmeros corredores
contidos nas dependências da Suprema Corte, está em curso um mecanismo de investigação, denominado inquérito, instaurado pelo ministro
Dias Toffoli e conduzido pelo ministro Alexandre de Moraes, que trabalha sem
objeto determinado que, na prática, dá liberdade a um ministro – já poderoso por natureza – para investir contra qualquer
um a qualquer tempo.
Pois bem, não é aceitável que esse inquérito
avance sem respeito óbvio ao devido processo legal. Quais são o objeto e os
fatos investigados? Delimitar uma investigação sem definir sujeitos e
investigar atos indeterminado, sem corte de tempo e espaço, é algo intolerável em
observância aos princípios basilares do Estado Democrático de Direito.
Frente aos fatos, podemos nomeá-lo,
carinhosamente, de “inquérito mágico”, em que cabe absolutamente tudo, qualquer
coelho, sem que seja necessária a justificativa de determinada ação ou omissão.
Veja, não há ninguém mais poderoso em nosso país do que um ministro da Suprema Corte. Se
você, membro da Suprema Corte, guardião da Carta Maior, investe diariamente seu
tempo contra essa condição, contra sua natureza, acaba por alimentar a
narrativa daqueles que afirmam ser dispensável a existência dessa instância
terminal.
Ora, caso o plenário da Corte não se debruce
sobre essa questão em sede de Agravo Interno, chegaremos ao seguinte paroxismo:
quem oferecerá a ação penal? O próprio ministro Alexandre de Moraes, depois de
conduzir todo inquérito? Afinal, o Ministério Público não o reconheceu esse ato
como legítimo. Indo além, já proferiu entendimento referente ao seu
arquivamento.
Estamos diante de uma verdadeira anomalia
jurídica, em que não haverá sujeito legalmente capaz para executar o
oferecimento da Denúncia Criminal. Isso é perigoso. Quando se chega a esse
ponto, de se esticar a corda das Instituições dessa maneira, perdem todos. A sociedade
como um todo perde.
É incrível ter que lembrar isso, mas o
sistema penal acusatório brasileiro determina a separação de funções da
persecução criminal. Em outras palavras, o nosso sistema não autoriza que o
órgão julgador seja o mesmo que investiga e acusa. Isso é uma obviedade sem
tamanho.
Juiz investigador? Essa figura não existe
desde as Constituições antecedentes, mas Moraes, por meio desse inquérito
assombroso, procede assim.
Em sua dura decisão relacionada ao
arquivamento do inquérito, Dodge confronta abertamente a legalidade dessa investigação,
pois, apesar do artigo 43 do Regimento Interno da Corte permitir esse ato de
ofício, não há nada que justifique as medidas bastante excessivas até então
tomadas.
A competência julgadora do STF não pode ser
amparada pelo seu Regimento Interno. Se
aplicado, esse conjunto de normas é anterior à Constituição Federal de 1988 e,
desse modo, eventual definição de competência está cristalinamente revogado
pelo artigo 102 do texto de 88. Isso é uma premissa constitucional básica.
Outro ponto questionável, refere-se ao
diploma legal a ser aplicado. O artigo 26 da Lei nº 7.170/83 (Lei de Segurança
Nacional) diz que “caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado
Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal,
imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação” deve ser
combatida por meio de ação pública incondicionada, sendo de titularidade do
Ministério Público, dando holofotes a ordem de arquivamento de Raquel Dodge,
segundo o artigo 62, inciso IV, da Lei Complementar nº 75/93 (Lei Orgânica do MPF).
Da mesma forma, quando o ministro Toffoli instaura o inquérito e, posteriormente, nomeia, sem sorteio, o ministro Moraes
como o responsável pela condução das investigações, representa uma
flagrante afronta ao princípio do juiz natural.
Frente aos argumentos retro expostos, nota-se
que estamos diante de uma escalada de autoritarismo que não encontra, sequer,
amparo legal ou precedentes judiciais. Os membros do Poder Judiciário – juízes,
desembargadores e ministros – não são agentes públicos eleitos. Vivemos tempos
sombrios cujas consequências são imensuráveis.
Lorenzo Bandoni
Muito bom texto Lorenzo ! sensacional análise perfeita dos acontecimentos.
ResponderExcluirNa minha opinião esta suruba jurídica tem o seu gênese na nossas ações arbitrárias da república de Curitiba onde cada agente do judiciário interpreta a lei ao seu bel-prazer onde a interpretação da lei é rigor para os meus inimigos e benefícios para os meus amigos , o judiciário brasileiro tem praticado uma justiça caolha em que os iguais são vistos de forma desigual.